terça-feira, 18 de outubro de 2016



Texto em branco

Nada para escrever. Mas a caneta teima em riscar o papel; teima em deixar suas pegadas na alvura do papel. Viajo com o pensamento para procurar alguma inspiração, ainda que longe, mas não encontro. Vontade de escrever. Fico olhando para o papel enquanto a caneta risca meia dúzia de palavras sem sentido. Nesse momento, minha atenção se volta para a tinta da caneta sendo deixada nas fibras de celulose do papel. Enquanto a caneta desliza, um fio de tinta fica impregnado, como o fio de muco deixado por uma lesma que rasteja. Bem, mais interessante do que isso é que, à medida que meus dedos se movem de forma calculada, a caneta vai fazendo curvas, obedecendo aos movimentos dos dedos que, por sua vez, obedecem aos impulsos do cérebro. Incrível! O que são letras? O que são palavras? O que é um texto?
Bem, primeiramente uma sequência de sinapses no cérebro. Impulsos nervosos. Ah! A inspiração. Esses impulsos comandam os movimentos dos dedos, que movem a caneta sobre o papel. Essa faz voltas e mais voltas e, letra após letra, escreve uma palavra. Palavras são apenas rabiscos em uma folha branca. E textos são apenas grupos de rabiscos; rabiscos gregários. E qual o sentido das palavras? Qual o sentido de um texto? Bem, esse aqui não tem sentido, mas o sentido geral de um texto é o mesmo sentido que tem a inspiração que faz o cérebro mandar mensagem para a mão, que escreve o texto. Textos são mesmo incríveis. Escrever é simplesmente extraordinário. Sensação metalinguística! Bom, chega de enrolação. Vamos procurar inspiração para escrever um texto que realmente faça sentido.
Levanto da cadeira; olho pela janela. Lá fora os pássaros estão cantando. Uma leve brisa balança os galhos frágeis das árvores. O céu está colorido. No horizonte, o rubror da aurora ainda permanece. Um pouco mais acima, um tom lilás. No meio do céu, um azul profundo. Algumas poucas nuvens brancas. Mas, e a inspiração? Apesar da beleza do amanhecer, não me vem nada à cabeça para escrever.
Volto para a cadeira. Olho para o papel. Tento completar o pouco que eu já rabisquei. Tento encontrar o sentido das palavras. Um forte vento assopra e vira a página. Também, eu não deveria estar tentando escrever no rumo da janela. Sento em outra cadeira, fora da direção da janela. Olho novamente para o papel e vejo simplesmente palavras sem sentido; texto em branco. Olho para as paredes, para o teto, para os móveis; e a inspiração não vem. Fixo o olhar em um ponto qualquer; um ponto em branco; um ponto sem ponto; um ponto aleatório do plano cartesiano da parede, formado pelos eixos x e y da minha imaginação. E nada. Bem, não é hoje que eu vou produzir um texto. Desisto. Nada para escrever.

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