quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

 Universo sem filtro


Deixa-me prosar. Passarei a contar como é realmente o universo. Como Deus o vê. Como os seres sobrenaturais o veem. É um universo sem filtro. Tudo que há se vê. Não há limitação de existência nem de sentidos para se detectar o que se há. Nada está escondido. Tudo se explicita aos sentidos do observador. Tudo é palpável. Sentido por sentidos que nunca sonharíamos em imaginar. Sem o filtro dos cinco sentidos. Sem o fardo que é o corpo material, que torna translúcida a alma que doutra forma seria transparente. As dimensões não são três só, nem quatro, nem mil. São infinitas. Tudo que no nosso conhecimento é limitado, na verdade é infinito. Limitada é a nossa capacidade de assimilá-lo.

O universo tem um som de fundo. Um som que se apresenta na maneira que a matéria deforma o espaço-tempo. Um som que está em constante melodia, formada pela movimentação e mutação do que se há. Uma música infinita soando no infinito. Soando para nenhum ouvido ouvir. Soando sem se utilizar de ondas sonoras. Porque os sentidos são apenas formas diferentes de se perceber o mundo. Tudo que se ouve, pode-se ver. Tudo que se apalpa e se sente pode ser ouvido. O ondular da água escorrendo em uma pedra, o balanço da areia à mercê do vento ou da maré, a irregularidade do relevo, tudo pode ser sentido em ondas sonoras. É tudo música. O universo é música. A chuva seria-nos uma melodia grandiosa se pudéssemos ouvir de forma separada e reconhecível a ressonância de cada pingo em cada superfície diferente.

Como Einstein previu, tudo é relativo. Um montinho de terra é exatamente igual a uma montanha. A diferença é quanto zoom foi aplicado. Tudo depende de que olhos estão olhando. A diferença não está nas coisas e sim no tamanho do observador. Uma formiga é do mesmo tamanho de um hipopótamo e um besouro tem as medidas de um automóvel. O arco-íris pode ser palpado e sentido como gelatina imersa na água, mas também pode ser visto como uma estreita faixa no céu que leva a potes de ouro, um sonho distante e impalpável.

Existe felicidade em tudo que se sente, e sente-se mais do que se tem consciência. Tudo o que há pode ser sentido: as fibras musculares se contraindo, o sangue se movimentando nos vasos sanguíneos, os líquidos dos tecidos sofrendo osmose. Só não temos sentido para sentir tudo isso. Temos um filtro que nos limita a quase zero. O ser que não possui esse filtro não consegue sequer imaginar quão restritos são nossos sentidos. Apenas percebemos uma fração insignificante do que é o universo. As coisas podem ser percebidas com todos os infinitos sentidos em todos os níveis de aproximação no microscópio do universo. Ele é muito mais infinito do que imaginamos. Infinitas vezes.

Viajando na imensidão do espaço-tempo, ouço a imagem das supernovas como se fosse um barítono em uma melodia infinita ou foguetes se explodindo ao longe, nos horizontes indefiníveis do universo. Um show pirotécnico de sons que não ouvimos e cores que não vemos. O ar só não tem cor porque nossa visão é incapaz de captar o tipo de onda emitida ou refletida pelas moléculas. Em universos paralelos, os sentidos percebidos por nós devem estar em outra faixa, incompreensíveis para nós neste universo. Se essas faixas não se sobrepõem, um universo paralelo pode não ter nada que se assemelha com o que há neste. Claro, segundo a nossa percepção.


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