Ruínas linguísticas
Não pretendo escrever
utilizando verbetes incógnitos para tornar laboriosa e ímproba a compreensão;
isso seria afrontar o bom senso com armas contundentes e déspotas. Aliás, o que
seria de um escrito ilegível? Tornaria o alfabetizado analfabeto. Por isso uso
vocabulário modesto, tangível e axiomático, acessível a todos os públicos. Por
mais intransitivos que sejam os verbos, complemento-os. Por mais perifrásticos que sejam os períodos, torno-os ainda mais circunlóquios. Por mais abstratas que
sejam minhas ideias, concretizo-as. Nada de obscurecer a essência do que é dito
com a obumbração de estereotipia que protege textos acadêmicos como baluartes erguidos
a pedras, à maneira de penedos e calhaus salvaguardando a orla marítima da
bravura das matas interiores. Obstinação sórdida!
Almejo discorrer aqui
acerca da restrição lexical que a última flor do Lácio vem sofrendo, mais
febrilmente, nos últimos tempos. E que léxico vasto e ancho a nossa língua ostenta!
Tão opíparo quanto úberes amojados de reses a ponto de partejar. Colossal em
abundância como o é em salpicos a plumagem variegada de um polhastro pedrês.
Afinal, quem tem mais
amplo vocabulário do que os capiaus? Pouco cognoscível para os citadinos,
talvez, visto que esses últimos sofrem com mais frequência e pujança do mal
lúbrico, por vezes convincente - para eles, não para mim -, de adaptar seu
vocabulário a linguagens estereotipadas que buscam, em lugar de profusão e
magnificência, a austeridade e a parcimônia da redundância semântica.
Ah, por onde andas,
galhardíssima mesóclise? Por que abandonaste nossa construção sintática e te
deixaste comutar por despojadas próclises, que não trazem nenhum sentido poético
aos excertos modernos? Eras a posição mais egrégia e deslumbrante dentre todas as que um pronome pessoal átono do caso oblíquo podia ocupar. Modernidade! A
maldita modernidade causando a derrocada e o depauperamento da linguagem
textual. Dar-se-ia o caso de que voltarias a ensoberbecer nosso idioma alhures
no tempo?
Recuso-me à adesão
inconveniente e inaceitável a esse esfacelamento idiomático. Prefiro conservar
meu cunho caipira a cambiar minha fala e escrita para algo menos feérico e mais
malparecido, algo que eu alvitro ser torpe e abjeto. Deixo transparecer a
primordialidade de se utilizar metáforas sempre e incessantemente. Metáforas são
adagas afiadíssimas capazes de tocar qualquer leitor. Têm aspectos tão retos
quanto cornos de agnos, encaracolados sobre si mesmos. Espira esplêndida!
Não que eu não goste de pronomes de tratamento - que, apesar de se referirem à segunda pessoa, conjugam-se em terceira -, mas “você”
é reles, ordinário e nauseabundo. Deveria ele sentir a metanoia de nos subtrair
a noção de conjugação em segunda pessoa; e ele não sente a mínima compunção de nos
omitir a capacidade de discernir entre os pronomes possessivos “teu” e “seu”.
Prolixos textos acadêmicos
que usam mais palavras do que substância! Na verdade, na sociedade em que
vivemos, o dom de orador deve ser sabiamente
albergado por todos para que, mesmo não se tendo o que dizer, tem-se o que
dizer; mesmo não se dizendo nada, diz-se muita coisa; mesmo não se apresentando
argumentos convincentes, convence-se; mesmo não se sendo um gênio, parece-o. Pro
lixo tudo que é prolixo! Insensatez de escritores gauche!
Se for teu gáudio
ouvir-me a utilizar essa linguagem trampolinada que usas, estejas certo de que não
to darei. Folgo-me, em vez disso, com o vetusto e provecto linguajar dos
antigos poetas. Aliás, pobres dos poetas que desejarem ter avultada e magnânima
carreira em tempos tão difíceis linguisticamente. Parece qualquer blague,
buscando espargir a pilhéria e a laracha, mas é a verdade incondicional e
impertinente em que vivemos em tempos tão modernos: em lugar de ganho, perda;
em lugar de locupletamento, retrocesso a ruínas.
Cara, marreta neles! Com a ousadia de uma araponga martelando ferraduras virtuais para calçar os "novos" poetas, aqueles que usam para se expressar palavras do idioma saxônico pela simples ignorância de nosso idioma. Senta a pua! Adorei, cara!
ResponderExcluirDizendo como eles:
ResponderExcluir"Poizé, véi. Eu fraguei isso aí e resolvi dá ideia."
Agora, normal:
Ainda chego ao teu nível. Cê consegue expressar muito mais poesia do que eu em muito menos palavras. Sendo mais conciso; isso que é siso! Kkkkk.