Vida de poeta
Reconhecimentos
póstumos: galardão de um poeta. As palavras dele correm soltas;
inteligentemente; solenemente. Vêm do fundo da alma. Ou será que são forçadas? Gostaria
de perguntá-lo a um poeta. Palavras têm grande valor, mas podem ser desdenhadas.
Podem ser desdenhadas com o mesmo esmero com que são desenhadas. Palavras podem
criar textos; ou serem textos por si mesmas. E o poeta é como um maestro que
pode controlar tudo isso. Ele tem o poder sobre as palavras. Ou talvez as
palavras têm poder sobre ele. Não sei bem como funciona.
Cada vez que penso em um
poeta, penso em alguém morto. Todo poeta está morto? Talvez sim. Não sei se a
definição da palavra me permite afirmar isso, mas afirmá-lo-ei de qualquer
forma: qualquer poeta não é um poeta se ainda estiver vivo. É como se a carreira
se concretizasse com a morte. E é como se a morte fosse o começo e não o fim.
Talvez todo começo seja um fim e todo fim seja um começo, mas não tenho
competência para afirmá-lo. Afirmá-lo-ei, não obstante. Afinal, não sou um
varão de Plutarco, mas me é dada a autoridade de usar meu não muito
desenvolvido intelecto para fazer assertivas de alto padrão intelectual. É o
que chamamos de licença poética. Sou um poeta? Talvez não. Acho que não. Talvez
serei um dia. Ou, pelo menos, morrerei um dia.
Se algum dia vires um
poeta andando às soltas, conta-mo; conta-me como o afortunado adquiriu o título
em vida. Um poeta não recebe nada por ser poeta; o é por paixão; uma paixão que
o consome por toda a vida. A fama vem. O reconhecimento acontece um dia. Só
esperam até que o poeta morra para então desabrocharem como a flor da noite,
que só se abre na obscuridade. A obscuridade da morte traz as palavras,
geralmente também obscuras, dos poetas mais afortunados, não de todos, à luz da
aurora literária. Nos tempos de hoje se fala nos poetas de outrora. Nos tempos
de amanhã falar-se-á nos poetas de hoje. Afinal, poeta bom é poeta morto.
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